Pois é, já tem um bom tempo que quero escrever sobre meu pai, mas com a loucura que virou minha vida, com a correria e com este tema super complexo acabei adiando tal texto por muito tempo.
Meu pai tinha 61 anos quando eu nasci, nunca foi casado com minha mãe e quando eu tinha mais ou menos três anos minha mãe caiu fora da relação que tinha com meu pai. Relação terrível, apesar do amor enorme que sei que eles sentiam.
Conheço pouco da história de vida do meu pai, e o que conheço foi porque minha mãe contou e até tento entender os motivos por ele ser como ele era, mas como filho já digo, não é fácil. Ele nasceu em 1928 em Salvador, foi abandonado pelo pai, provavelmente passou algumas dificuldades, minha avó se casou com um pintor, ele foi para o Rio de Janeiro, dedicou sua vida a medicina. Era um gênio, sem exageros, mas como todo gênio ele era um louco. Não tinha nenhum controle emocional. Com certeza tenho de agradecer meu pai por eu ser inteligente, mas também tenho de admitir que também puxei a loucura dele. DNA é fogo!
Claro, tenho uma vida de mémorias do meu pai, infelizmente a maioria ruim, vou contar as principais e espero conseguir passar um pouco do que penso dele, todo o ódio e a alguma admiração que sinto. Quando criança lembro muito do meu pai indo na nossa casa e gritando e brigando com minha mãe, algumas vezes lembro mais que outras e por conversar que já tive com minha mãe me lembro de coisas que não aconteceram como eu lembro. Mas a imagem é muito viva.
Ele morava em outra cidade, mas vinha muito a Goiânia, passava lá em casa para pegar meus irmãos e eu para irmos ao shopping, algum restaurante ou fazer qualquer coisa e dirigia como um louco, e eu gritava muito e brigava muito com ele. Eu era o típico garoto "mimado" que fazia escandalos no shopping quando queria alguma coisa e meu pai não queria me dar.
Grande parte das memórias que tenho são do meu pai me prometendo coisas que nunca cumpriria. Uma época eu quis morar com meu pai, ele sempre dizia que passaria para me buscar no domingo, todas as vezes, eu, um garotinho bobo, ficava com minhas malas prontas, sentado em uma cadeira alta que tinha lá em casa esperando por meu pai que nunca chegava. Quando me dava conta que ele não iria me pegar eu chorava e sobrava para minha mãe me acalmar.
Quando falei pela primeira vez que queria fazer um intercâmbio para os
EUA, lembro dele me dizer que tinha vários amigos médicos por lá e que me
mandaria para estudar, pois é, eu ainda não conheço os EUA e o intercâmbio que fiz
foi depois que meu pai morreu.
Boa parte das minhas memórias são do meu pai falando coisas que nunca deveria ter dito, dele oferecendo bebidas pra gente (crianças ainda), lembro de pensar que preferia ter outro pai, mesmo que pobre, mas presente ou que ele poderia pelo menos me dar muito dinheiro (que ele já teve e simplesmente não quis dar) já que ele não dava amor mesmo.
Quando crianças, minha mãe fazia eu e meus irmãos passarem as férias com meu pai, para não perder contato, uma tentativa de nos aproximarmos do meu pai, acho. Uma coisa de mãe preocupada e que tentava fazer o certo e o melhor pra gente. Ficavamos todas as férias na casa do meu pai, que na verdade era um hotel e sendo assim acabavamos ficando sempre sozinhos. Não tinhamos interesses comuns e hoje consigo ver de forma diferente, mas na minha cabeça de criança era um saco quando meu pai ia andar com a gente, mostras suas terras, as fotos que tirava de terra como se fosse uma construção maravilhosa e coisas do tipo.
Eu e meu pai brigavamos muito, eu era, por mais difícil que seja para
admitir, o filho mais parecido com ele, com um temperamento explosivo,
um brigão. Nunca abaixava a cabeça para ele, não havia respeito da minha
parte, já que nunca me senti respeitado. Tentava falar coisas "piores"
do que as que eu escutava.
Provavelmente a pior lembrança que tenho é uma das últimas ruins, quando eu já era grandinho, qual a lembrança? Ele me acusando de "fuder" a mulher dele. Isso mesmo, ele me acusando de comer a mulher dele. Depois descobri que ele falava a mesma coisa para outro filho, o irmão do meio do casamento dele, uns 30 anos mais velho que eu. Eu só tinha vontade de gritar pra ele que era viado nestas horas e mandar ele pro inferno. Este foi o único motivo que fez eu deixar de conversar com meu pai por algum tempo.
Mas como disse, tenho algumas lembranças boas. Lembro principalmente de quatro meses que passei morando com meu pai, quando estava na quarta série, e minha mãe me levou nas férias e eu fiquei depois. Nesta ocasião não tendo como meu pai dizer não. Nesta época eu fiquei muito sozinho, mas alguns momentos me marcaram muito. O hotel era enorme e eu tinha medo daquele lugar (foi uma das poucas vezes na vida que admiti ter medo), eu dormia todas as noites num colchão no chão ao lado da cama do meu pai, nunca no meu quarto.
A luz acabava muitas vezes e eu tinha muito medo daquele hotel no escuro, ele sempre tinha que aguentar. Me lembro também da gente na piscina uma vez e ele me ensinando algumas coisas em alemão e latim. Me lembro dele tentando me explicar matemática (coisa que ele nunca conseguiu, já que complicava tudo porque sabia demais) e também de uma vez que ele até ligou para um dos filhos mais velhos para perguntar uma palavra que eu tinha esquecido em inglês e ele também (guardanapo). Me lembro de uma seção "ridícula" de fotos que fizemos na praça do sol (uma praça perto da minha casa), eu, ele e minha irmã, todos fazendo posições de luta.
Nos últimos meses ou quem sabe no último ano de sua vida ele estava um pouco melhor, consegui ter algumas boas conversar com ele e uma das coisas mais marcantes aconteceu, ele me pediu desculpas depois de uma briga que tivemos. Nesta época eu já estava maior, conseguia sair das brigas e não mais revidar como criança.
Sempre soube que não sofreria quando meu pai morresse. Guardei muita mágoa, esperei durante toda minha vida para ver a mudança
daquele homem, ver ele se tornar um pai de verdade, que dá amor,
palavras amigas, quando ele morreu este foi o motivo que me fez sofrer um
pouco, minhas chances de ter um pai acabaram alí.
É.. Vamos combinar que as lembranças ruins realmente são de eventos mais marcantes e acho que vc só se recorda os bons pk teve pouco disso... As suas lembranças boas são de coisas banais, de cotidiano e tals.. E como vc praticamente não teve esse cotidiano, o pouco que teve fica marcado como lembranças incríveis!!!!
ResponderExcluirÉ uma pena que ele tenha morrido antes que pudessem se acertar, pk sou da maior opinião que essas pessoas... Digamos... "instáveis emocionalmente" (pra ser generoso) tendem a ter umas relações meio que hiatos com seus filhos na infância e depois, dependendo do filho, tendem a melhorar na vida adulta. Se trata de uma questão simples de condução, é claro que uma criança não vai conduzir a relação com uma locomotiva como era seu pai... Na vida adulta, qdo as feridas não deixam tanta cicatrizes e existe boa vontade, nego consegue passar a conduzir essa relação as vezes se tornam possíveis...
Dia desses vi uma entrevista da Pitty contando que sempre teve problema de relação com a mãe e que depois da vida adulta a coisa se tornou melhor e é por ai mesmo....
Mas eu compartilho muito com a opinião de Angelina Jolie que diz que a relação entre pai e filho é uma relação importante, mas nem sempre é possível e da pra sobreviver sem ela. Tenho uma tia que manteve um casamento de 13 anos com um misogeno louco que batia nela na frente das filhas e ela aguentou tudo em nome da relação pai/filho... Hj temos colaterais complicados nessas meninas, seria menos pior ser criadas longe do pai... Sinceramente, em determinados casos não acho que vale o sacrifício.
Concordo com vc completamente Gato, as vezes é melhor ser criado sem pai que com um "pai" terrível!!!
ExcluirSobre melhorar qndo crescer acho que nao, tenho irmaos com 50 anos mais ou menos e a relaçao sempre foi ruim...
pois é... não sei o que dizer... o Gato falou mta coisa...
ResponderExcluirmas assim... vc admitiu q vc não era mto diferente dele né? acho q o problema está ai mesmo, como vcs eram mto parecidos os choque era evidente, e vc mto criança não sabia lidar com isso, nem ele, o adulto da estória, e vc acabou não tendo a possibilidade de conviver com ele também né? principalmente depois de adulto q poderia vir a conduzir a relação como o gato disse. mas, voltando ao comentário do Gato, e acho q nossa maior diferença é essa, eu convivi com meu pai e vc não, então suas lembranças são apenas as lembranças de choque, eu não tenho lembranças amorosas do meu pai, mas eu ainda convivi com um, como direi, homem normal q não era meu pai, mas tb não era o meu carrasco, digamos assim. talvez houvesse mais lembranças de admiração dele se vcs tivessem convivido... né?
Entao Foxx, eu nao sei se haveria, sei de coisas que admiro nele, mas pq outras pessoas contaram..
Excluire quando disse que sou muito parecido com ele, quis dizer de um jeito mais complexo e infelizmente bem pior.. sou como ele em minhas relaçoes... por isso já tive namorados fantásticos, mas nao funciona.. sou um mini psicopata!!
Tento mudar com todas as forças, mas nao é fácil, nao mesmo!! Neste ponto que digo que DNA é fogo e sinceramente, é, já que só eu sei o tanto que quero mudar e o tanto que tento..
Se n tivesse de conversar mais de 15 minutos pra conquistas fazia o Dctor Ray, fácil!!!!
ResponderExcluirAi, to me sentindo a "Diana" e o "Filho do Astrólogo". Rsrsrs
ResponderExcluir- Também não me dou bem com papai, embora ele tenha me tido até novo. O problema é que ele não nasceu pra ser pai. Ele devia ser estéril! (O Maldito)
- Também tenho o gênio forte (como Daddy), embora eu tenha tentado agradar, não damos certo - mesmo. Daddy 'querido', já ficou sem fala umas 3 vezes. Mas é claro, no dia seguinte ele se recupera e dá a chimbatada com aquela lingua ferina.
- Também ameaçava morar com papai, cuja visão, era de um "Príncipe montado num cavalo branco". Doce ilusão... aiai (suspiro). Mas era só ameaça, pq lá no fundo sabia que "Ele" não me queria tanto assim. Afinal, quem quer participa. O que não foi o caso...
- O problema é que ele não participa, mas adora "cobrar" o que não: deu, ensinou, compartilhou...
- Com meu pai, você só tem 1 chance. Desperdiçou, fudeu!
- Não sou idiota e não dou murro em ponta de faca.
- Daddy também é uma figura "idolatrada", não sei você, mas aquela sombra de cobrança de ter uma inteligência "parecida" com a especialidade dele - é um soco no estomago! Até pq, meus talentos são outros.
- Meu pai ainda não morreu, e to me cagando pra isso. Ou seja, também não me importarei se ele morrer.
PS: Daddy, também me acusou de foder a foda dele! Foda! Porque nem esposa era - a cretina (ele tem um gosto peculiar pelos serviçais. Acho que como ele gosta de controle, nesse caso, ele realmente pode controlar a mulher. O bom é o que o tempo dá o troco). Na época que ele me acusou, eu tinha 16 anos! Isso choca e machuca profundamente, né!?
ResponderExcluirHomotoon, tenho que rir dos seus comentários... Tem tanta coisa parecida, até o gosto por serviçais! É, machuca né.. eu devia ter uns 14 ou 15 anos, sei lá... Machuca mesmo, tanto que foi a vez que fiquei sem falar com meu pai por um bom tempo...
ExcluirOlha, meu pai nao cobrava, nao nada... a gente passava férias com ele e em um mes nao o viamos quase nunca.. só no almoço e antes de dormir mesmo, o resto do tempo ficavamos fazendo outras coisas...
Eu nao sei se já achei meu pai o principe no cavalo branco, sei que era inteligente e mil coisas, mas sempre soube também que era doido... eu só queria um pai presente, independente de ser bom ou nao, acho que era mais isso que uma questao de idolatrar...
Deste tema que eu falei tem muito ainda que falar se eu espremer e pelo visto todo mundo tem... pq a maioria dos pais sao tao fdputa? Que merda é essa? E ainda somos gays, vamos aguentar homens problematicos e que podem ser deste jeito... ai ai ai... e tem gente que acha que é escolha?? FALA SÉRIO!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Mas eu vou colocar uma diferença real que meu pai tem da maioria (ou pelo menos eu acho), suspeitavamos todos que ele estava doente mesmo, iriamos interditar e tudo pq nao dava... ele nao podia cuidar dele mesmo a gente achava e ele era alcolatra... e velho ainda... pensa a merda...
O Cara Comum me indicou seu blog na entrevista dele e cá estou. Penso o seguinte sobre pais: Muito ajuda quem não atrapalha. Ou seja, o papel deles é facilitar nossa vida, não torná-la um tormento! Abcs, e to seguindo o blog.
ResponderExcluirSurpreendente, emocionante e intenso relato. Adorei. Incrível como o passado lança luz sobre quem somos hoje. Bjz, querido! E tens razao: comigo é sempre dia de rock, bebê!
ResponderExcluirOlha, meu pai é uma figura tão apagada que dá tédio de falar sobre. mas a cada diz me convenço mais de que família é a instituição mais cruel que existe na face da Terra...
ResponderExcluirAbração!!
Vou te mandar a tal marmitinha... agora... tiraoolhograndedomeupirata,porra! Hahahahahahaha! Aqui no pampa é assim: tudo é grande! Hugz, querido!
ResponderExcluirAi amigo, eu já tive um pai maravilhoso, presente, amoroso, pai herói. E hoje, 20 anos que ele morreu me faz muita falta.
ResponderExcluirUm beijo.